quarta-feira, 11 de março de 2009

"O desaparecimento das chinelas azuis"

Sobre como os objetos desaparecem. Deparei com esse pensamento logo após ter revirado toda a casa à procura de umas chinelas. Deu-se que acendi luzes, revistei todos os cômodos, e nada. Foi tão misterioso o acontecido que passei a temer encontrá-las na porta de casa sob o capacho como se acabassem de chegar, dar com elas nos elevadores, nos corredores do prédio, passei a imaginar-lhes uns pés que dessem-lhes vida e as levassem por aí. Ao pensar nisso, lembrei de um desejo antigo de anotar tudo o que a minha observação permitisse, o que poucas vezes consegui. Deu-me que as chinelas desaparecidas eram como palavras que, quase sempre quando perdem na forma ganham em significado, mas que, quando perdidas são nada, ou apenas um fio na memória de alguém (que deveria resgatá-las). Ainda sobre chinelas e os desaparecidos, relembro a história de uma amiga que alugou um apartamento e que, ao mudar-se, deu de cara com um par de chinelas surradas­, desbotadas e ressequidas pelos meses desapercebidas no box do banheiro. Boa neurótica que era, ligou para a imobiliária para arguir e recebeu em resposta: "Sim, eram do antigo inquilino que morreu, mas não morreu aí não, foi no hospital mesmo". Na época não entendi por que desfez o negócio do apartamento, mas hoje, após o sumiço de minhas chinelas e do quão a memória dos desaparecidos podem se tornar vivazes, entendo-a perfeitamente. Por isso, registro aqui os acontecimentos e aproveito para lançar um apelo àqueles pés metafóricos para que devolvam minhas chinelas azuis...

2 comentários:

  1. Klaus,é uma delícia ler suas postagens!
    Acaba de ganhar uma leitora assídua,pois fã e admiradora de você como pessoa eu já sou!
    Beijos!

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  2. Klaus, o tempo ultimamente tem sido minhas chinelas azuis. Onde foi parar? Por que não aparece de vez em quando? Escondido toda vez que preciso usar...
    Beijo corrido
    Shirley

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