sábado, 4 de abril de 2009

Sujeito e pessoa

Acho terrível que nesse mundo moderno tenham deslocado o sujeito da pessoa. Há quem aja da pior forma possível sob a máscara da Ética, acreditando ser justificável agir assim para tirar de cena um sujeito (que nesse caso, promoveu uma ação), utilizando-se de recursos que passam do vampirismo à canibalização, da rapinagem à predação (entre as vilanias humanas e animais), com o discurso de que não tem nada de pessoal contra a pessoa prejudicada.

Deslocaram tanto que virou esquizofrenia. Pessoas declaram abertamente seu ódio, cobiça, baixa auto-estima, e ao mesmo tempo, querem ser amadas, respeitadas, e festejadas! Paradoxos modernos: gente que entra no ônibus, senta na janela, e no ponto final, quer descer antes de todo mundo, pisando na cabeça de quem estiver no caminho. Nas escolhas são sempre as primeiras com a justificativa de que, se não for assim, serão as últimas. Gente que não sabe estar por último. Gente que não sabe ser caminho entre uma coisa e outra.

Gente assim, muitas vezes, esconde-se sob a máscara da fragilidade, da humildade, da compaixão cristã. Quando minimamente incomodadas por pessoa ou situação, jamais resignam-se, não observam em perspectiva, nem se importam com a índole e o lado emocional de cada um, nem tem boa-vontade (grande página da Ética em Kant). Ao contrário, cegas, querem reparação e vão até às últimas consequências. Quando conseguem desculpas, não aceitam, e aí começa a batalha. Repare como é comum uma guerra ser acirrada após um pedido de desculpas.

Caso parecido ao dos mendigos que espancaram a velhinha que lhes dava de comer. Pai que mata filha. Neto que bate na avó. Babá que bate em bebê, enfermeira que espanca idosos. Bestialidades humanas que vemos dia-a-dia no circo de horrores que é o mundo. Pessoas escandalizadas reagem munidas de uma ética eletrônica. Ética porque está sendo filmada, ética para sair na foto, ética porque está todo mundo olhando. Fora isso, é selvageria pura. É gente comendo gente.
Fico com pena do tigre amestrado que mordeu a cabeça do adestrador.

Mordeu provavelmente influenciado pela fome do homem.

Foi gente ética quem julgou Sócrates, que retratou-se e esse foi seu fim. Desde aqueles tempos todo o remédio do mundo não pode curar quem não aceita desculpa. É uma mágoa que transborda em intolerância: fiel que não perdoa; bom que não aceita; inteligência que faz de escada gente utilitária. Vive-se em duplicidade, num jogo de sentidos ocultos em que se maneja o desfecho trágico. Saber a verdade, saber medir a verdade, saber mesurar sua justeza para com a verdade seria nossa dívida ética para com Nietzche. Nosso acerto de contas para com Sócrates. Nossa dívida para com as pessoas que foram separadas dos sujeitos por conveniências da modernidade.

2 comentários:

  1. Adoro sua virulência, usada no ponto certo, com argumentos seguros e contra pessoas certas, que estão evidentemente erradas.
    Cicuta neles (e nelas)...
    Beijos,
    Shirley

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  2. Tomara que seus dias sejam sempre cheios de acontecimentos "inéditos" para que você posso nos presentear com suas palavras.
    Sou sua fã!

    Beijos

    Déia

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